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CRIMES PREVIDENCIÁRIOS (Apropriação indébita e sonegação previdenciária)

CRIMES PREVIDENCIÁRIOS (Apropriação indébita e sonegação previdenciária)

Os crimes previdenciários – crimes praticados contra a Previdência Social ou mesmo outras áreas da seguridade social – mais comuns e importantes do Código Penal são os de apropriação indébita previdenciária, sonegação de contribuição previdenciária, falsificação de documento público contra a Previdência Social e estelionato previdenciário. Sendo que neste texto será abordado os dois mais complexos que são o de apropriação indébita previdenciária (art. 168 –A) e o de sonegação de contribuição previdenciária (art. 337 – A).

O primeiro crime é o de apropriação indébita previdenciária, apesar do nome e da localização no código penal, temos que deixar claro que o tipo penal difere muito do crime de apropriação indébita do artigo 168, caput do Código Penal, o qual é crime contra o patrimônio.

Existe uma crítica doutrinária quanto a inserção do crime na parte que trata dos crimes contra o patrimônio, pois, o bem jurídico violado é a previdência social e consequentemente os cofres públicos, assim entendem que estaria melhor inserido nos crimes contra a ordem tributária ou nos crimes contra a administração pública.

De forma simples o autor do crime tem por lei o dever de recolher a contribuição de terceiros para o devido repasse e não o faz, apropriando-se do montante, daí a justificativa para o nome.

Trata-se de norma penal em branco homogênea, merecendo o complemento de outras leis e regulamentos. Especialmente, deve-se consultar a Lei 8.212/91, que traz os prazos e as formas legais para o repasse ser feito. É interessante analisar a redação do art. 30 da Lei 8.212/91, com as alterações proporcionadas pelas Leis 11.718/2008 e 11.933/2009. In verbis:

Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas:

I – a empresa é obrigada a:

a) arrecadar as contribuições dos segurados empregados e trabalhadores avulsos a seu serviço, descontando-as da respectiva remuneração;

b) recolher os valores arrecadados na forma da alínea a deste inciso, a contribuição a que se refere o inciso IV do art. 22 desta Lei, assim como as contribuições a seu cargo incidentes sobre as remunerações pagas, devidas ou creditadas, a qualquer título, aos segurados empregados, trabalhadores avulsos e contribuintes individuais a seu serviço até o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao da competência; (Redação dada pela Lei nº 11.933, de 2009). (Produção de efeitos).

c) recolher as contribuições de que tratam os incisos I e II do art. 23, na forma e prazos definidos pela legislação tributária federal vigente;

II – os segurados contribuinte individual e facultativo estão obrigados a recolher sua contribuição por iniciativa própria, até o dia quinze do mês seguinte ao da competência;

III – a empresa adquirente, consumidora ou consignatária ou a cooperativa são obrigadas a recolher a contribuição de que trata o art. 25 até o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao da operação de venda ou consignação da produção, independentemente de essas operações terem sido realizadas diretamente com o produtor ou com intermediário pessoa física, na forma estabelecida em regulamento;

IV – a empresa adquirente, consumidora ou consignatária ou a cooperativa ficam sub-rogadas nas obrigações da pessoa física de que trata a alínea “a” do inciso V do art. 12 e do segurado especial pelo cumprimento das obrigações do art. 25 desta Lei, independentemente de as operações de venda ou consignação terem sido realizadas diretamente com o produtor ou com intermediário pessoa física, exceto no caso do inciso X deste artigo, na forma estabelecida em regulamento;

V – o empregador doméstico é obrigado a arrecadar e a recolher a contribuição do segurado empregado a seu serviço, assim como a parcela a seu cargo, até o dia 7 do mês seguinte ao da competência;

VI – o proprietário, o incorporador definido na Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964, o dono da obra ou condômino da unidade imobiliária, qualquer que seja a forma de contratação da construção, reforma ou acréscimo, são solidários com o construtor, e estes com a subempreiteira, pelo cumprimento das obrigações para com a Seguridade Social, ressalvado o seu direito regressivo contra o executor ou contratante da obra e admitida a retenção de importância a este devida para garantia do cumprimento dessas obrigações, não se aplicando, em qualquer hipótese, o benefício de ordem;

VII – exclui-se da responsabilidade solidária perante a Seguridade Social o adquirente de prédio ou unidade imobiliária que realizar a operação com empresa de comercialização ou incorporador de imóveis, ficando estes solidariamente responsáveis com o construtor;

VIII – nenhuma contribuição à Seguridade Social é devida se a construção residencial unifamiliar, destinada ao uso próprio, de tipo econômico, for executada sem mão-de-obra assalariada, observadas as exigências do regulamento;

IX – as empresas que integram grupo econômico de qualquer natureza respondem entre si, solidariamente, pelas obrigações decorrentes desta Lei;

X – a pessoa física de que trata a alínea “a” do inciso V do art. 12 e o segurado especial são obrigados a recolher a contribuição de que trata o art. 25 desta Lei no prazo estabelecido no inciso III deste artigo, caso comercializem a sua produção:

a) no exterior;

b) diretamente, no varejo, ao consumidor pessoa física;

c) à pessoa física de que trata a alínea “a” do inciso V do art. 12;

d) ao segurado especial;

XI – aplica-se o disposto nos incisos III e IV deste artigo à pessoa física não produtor rural que adquire produção para venda no varejo a consumidor pessoa física.

XII – sem prejuízo do disposto no inciso X do caput deste artigo, o produtor rural pessoa física e o segurado especial são obrigados a recolher, diretamente, a contribuição incidente sobre a receita bruta proveniente:

a) da comercialização de artigos de artesanato elaborados com matéria-prima produzida pelo respectivo grupo familiar;

b) de comercialização de artesanato ou do exercício de atividade artística, observado o disposto nos incisos VII e VIII do § 10 do art. 12 desta Lei;

c) de serviços prestados, de equipamentos utilizados e de produtos comercializados no imóvel rural, desde que em atividades turística e de entretenimento desenvolvidas no próprio imóvel, inclusive hospedagem, alimentação, recepção, recreação e atividades pedagógicas, bem como taxa de visitação e serviços especiais;

XIII – o segurado especial é obrigado a arrecadar a contribuição de trabalhadores a seu serviço e a recolhê-la no prazo referido na alínea b do inciso I do caput deste artigo.

A referida Lei 8.212 de 1991 dispõe sobre a organização da Seguridade Social, na qual o institui Plano de Custeio, e dá outras providências. Lei de suma importância para caracterizar e conceituar diversos termos que são tratados nos crimes aqui abordados.

A tão falada Seguridade Social é protegida e tratada pela Constituição Federal, sendo um direito fundamental, entabulada no artigo 194 da CF, e em seu caput encontra-se sua definição: “conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”.

Imperioso frisar de que se trata de direitos positivos de segunda e terceira dimensão. Posto que é obrigação do Estado, no qual tem como escopo suprir as necessidades como um todo, assegurando o  mínimo necessário para a sobrevivência e garantia das necessidades basilares do cotidiano com dignidade. E na qual abrande a todos do território nacional, havendo assim universalidade tanto na cobertura quanto no atendimento.

Além da definição trazida na CF, veja esta que define de forma muito assertiva: “Conjunto de medidas adotadas pelo Estado, por meio de organizações próprias ou subvencionadas, destinadas a prover as necessidades vitais da população do país, nos eventos básicos previsíveis e em outras eventualidades, variáveis segundo as condições nacionais, que podem verificar-se na vida de cada um, por meio de um sistema integrado de seguro social e de prestação de serviços, de cuja administração e custeio participam, direta ou indiretamente, os próprios segurados ou a população mesma, as empresas e o Estado” (Moacyr Velloso Cardoso de OLIVEIRA).

A Seguridade Social, portanto é o gênero, mais abrangente, na qual são espécies: a saúde, a previdência social e a assistência social. Sendo que além destas peculiaridades, a maior diferença entre seguridade social e previdência social  – letra minúscula mesmo, já que ao usar a terminologia como nome próprio faz menção à autarquia – é atinente a contribuição. Na seguridade social abarca a todos os cidadãos de que necessita de proteção e cuidado do Estado, independente de verter pagamentos ao sistema da previdência social ou não. Já a previdência social, apenas acolhe aos seus segurados, ou seja, àqueles que são filiados à previdência social e que fazem o pagamento das contribuições.

Nesta toada, importante mencionar a lei 8.213 de 1991 na qual dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Esta lei é mais específica e voltada para os benefícios de aposentadoria da previdência social.

Quanto ao crime objeto material é a contribuição previdenciária arrecadada e não recolhida. O elemento subjetivo do tipo específico, consubstanciado na vontade de fraudar a previdência, apossando-se, indevidamente, de quantias não pertencentes ao agente. Consistente na especial vontade de se apossar de quantia pertencente ao INSS. Demandando-se o dolo específico – a vontade de fraudar a previdência, apossando-se do que não lhe pertence –, deixa de existir mera cobrança de dívida, surgindo o elemento indispensável para configurar o delito previdenciário, entendimento de Guilherme de Souza Nucci. Cabe ressaltar, que para que ocorra o crime tem que levar em consideração que o recolhimento deve ser no prazo e forma legal ou convencional. De acordo com o STJ: Não precisa de comprovação de dolo específico (STJ) EResp 1.296.631-RN.  Prescindível o animus rem sibi habendi.

A figura do caput tem por fim punir o substituto tributário que deve recolher o que arrecadou do contribuinte à previdência social e não o faz. É a aplicação do art. 31 da Lei 8.212/91, in verbis: “Art. 31.  A empresa contratante de serviços executados mediante cessão de mão de obra, inclusive em regime de trabalho temporário, deverá reter 11% (onze por cento) do valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços e recolher, em nome da empresa cedente da mão de obra, a importância retida até o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao da emissão da respectiva nota fiscal ou fatura, ou até o dia útil imediatamente anterior se não houver expediente bancário naquele dia, observado o disposto no § 5o do art. 33 desta Lei”.

O recolhimento previdenciário por parte do empregador, a chamada contribuição patronal, é em geral, sob a alíquota de 20% (vinte por cento) sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas, a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhes prestam serviços.

Quando se refere a remuneração engloba além do salário todos os acréscimos neste, como por exemplo as gorjetas e outros ganhos habituais, não incidindo sobre o valor qualquer acréscimo que seja atinente a indenizações.

A empresa ou equiparado se sujeita também ao recolhimento de contribuições a terceiros que são as entidades e fundos, como por exemplo, o sistema “s” (Sesc, Senai), incidentes sobre o total de remuneração de empregados e trabalhadores avulsos a seu serviço, de acordo com o enquadramento de sua atividade no FPAS e as alíquotas constantes do Anexo III da Instrução Normativa MPS/SRP n. 03, de 2005.

Por isso a importância de estar sempre com os dados corretos e atualizados da GFIP (guia de recebimento do FGTS e informações a previdência social), posto que é esta guia a qual consta, dentre outras informações, a remuneração dos segurados,  ou seja, dos empregados. Assim como também a exposição de trabalhador a agente nocivo.

Trata-se de crime próprio (aquele que só pode ser cometido por sujeito qualificado, que é o substituto tributário); Porém, Cleber Masson entende que é crime comum, o qual permite a participação, como no caso do contador de uma empresa que induz, instiga ou auxilia seu administrador a não repassar ao Poder Público as contribuições descontadas dos empregados.

É importante lembrar que pessoa jurídica não pode ser responsabilizada criminalmente, por ausência de previsão constitucional e legal!

Sujeito passivo: União Federal – Competência é da Justiça Federal em todos os casos do art. 168-A e a ação é pública incondicionada. Artigo 109, IV da Constituição Federal.

Crime formal (delito que não exige, para sua consumação, a ocorrência de resultado naturalístico) doutrina dominante, para o STF é material depende de lesão aos cofres públicos. Inq 2.537 AgR/GO, rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, j. 10.03.2008, noticiado no Informativo 498.

Deixar de recolher significa não arrecadar ou não entregar à previdência social o que lhe é devido, conforme art. 168-A, § 1.º, I, do CP. O objeto é a contribuição ou outra importância destinada à previdência. A figura corresponde ao antigo art. 95, d, da Lei 8.212/91.

De acordo com o STJ é crime omissivo próprio, que se perfaz com a mera omissão de recolhimento de contribuição previdenciária no prazo e na forma legais. (STJ) EResp 1.296.631-RN, consequentemente, não admite tentativa!

De acordo com Cleber Masson: “Prevalece o entendimento de que se afasta a culpabilidade, em face da ausência de um dos seus elementos constitutivos, que é a exigibilidade de conduta diversa. Especialmente em períodos de instabilidade econômica, obstáculos instransponíveis se põem no caminho dos empregadores, o que justifica a inexigibilidade de conduta diversa (causa supralegal de exclusão da culpabilidade), pois não se poderia respeitar integralmente a legislação tributária se isso ferisse de morte o empregador”.

Figuras equiparadas: § 1.º

Art. 168, §1º – volta-se diretamente ao contribuinte-empresário que deve recolher a contribuição arrecadada dos seus funcionários.

No caso deste delito – diversamente da figura do caput, que somente menciona a contribuição previdenciária – aponta-se outra importância (juntamente com a contribuição). Estipula o art. 195, § 4.º, da CF.

Sendo que esta outra importância refere-se ao custeio da seguridade social para a destinação a saúde pública e os programas de assistência social.

Neste caso o crime consumam-se com a ausência de recolhimento à Previdência Social ou a ausência de pagamento ao empregado do benefício previdenciário, no prazo determinado pela legislação respectiva.

 

Inciso I

“deixar de recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público”.

Conforme orientação de Cleber Masson: “Este tipo penal visa incriminar a conduta do denominado “substituto tributário” ou “contribuinte de direito”, que recebe por lei a atribuição de arrecadar e recolher o tributo devido pelo contribuinte de fato”.

É importante lembrar que os segurados são os empregados que prestam serviços de natureza urbana ou rural à empresa. Terceiros são aqueles que estão a serviço do responsável tributário, exercendo atividade econômica sujeita à dedução da contribuição social ou outra importância destinada à previdência, como as empresas cedentes de mão de obra e as cooperativas. Finalmente, “arrecadadas do público” é uma expressão que se refere às importâncias oriundas dos concursos de prognósticos e dos espetáculos desportivos.

 

Inciso II

“deixar de recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços”.

Este tipo, previsto no art. 168-A, § 1.º, II, do CP, insere como objeto da conduta deixar de recolher as contribuições, que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços.

Inciso III

“deixar de pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa pela previdência social”.

Deixar de pagar significa não satisfazer encargo devido. O objeto é o benefício devido a segurado, já reembolsado pela previdência social. É o previsto no art. 168-A, § 1.º, III, do CP.

O benefício devido a segurado, é o ganho pago pela previdência social ao segurado, através da empresa. Normalmente é adiantado pela empresa, que depois termina compensando os valores com as contribuições devidas pela folha salarial. Exemplo de benefício: salário-família.

Outrossim, conforme o artigo 255 do Regime da Previdência Social, que são os valores pagos pelas empresas a títulos dos referidos benefícios e que serão posteriormente reembolsados pela União, através da compensação no pagamento das contribuições previdenciárias patronais devidas.

Neste inciso faz menção quando a empresa recebe o  valor da previdência social, através dos abatimentos nas contribuições futuras, e não efetua o devido repasse para o empregado. O qual tem direito a receber tais acréscimos, no caso do salário-família, ou tais benefícios, como o salário-maternidade.

“Caso a empresa tenha se apropriado de valor (que deveria ser reembolsado) e não faça a transferência ao trabalhador, incidirá no crime estudado. A lei não fala até que momento, mas entender-se-á quando devida a quitação. O salário-família deve ser pago junto com a remuneração (PBPS art. 68), o mesmo valendo para o salário-maternidade

O salário-família é um acréscimo incidente no salário do empregado o qual se enquadre nos requisitos para seu recebimento. Primeiramente além, de por certo, ter a qualidade de segurado, este deve ter salário de contribuição igual ou inferior a R$ 1.425,56 (mil, quatrocentos e vinte e cinco reais e cinquenta e seis centavos). Ultrapassado este critério da renda, terá direito as famílias que tenham filhos ou equiparados de qualquer condição menores de 14 (quatorze) anos e/ou inválidos de qualquer idade. Não há limite de cotas par família, podendo inclusive o pai e a mãe receber por cada filho que se amolde aos requisitos.

Extinção da punibilidade: § 2.º

“É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara, confessa e efetua o pagamento das contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal”.

Exigem-se, para que a punibilidade do agente da apropriação indébita previdenciária seja afastada, os seguintes requisitos:

a) declaração do valor devido (demonstrar à previdência o montante arrecadado ou recolhido de contribuinte ou segurado e não repassado);

b) confissão da prática delituosa, isto é, a admissão de não ter feito o recolhimento ou o repasse na época e da forma previstas em lei.

c) efetuar o pagamento.

d) prestar as informações devidas;

e) espontaneidade

f) agir antes da ação fiscal, necessita ser feita antes do início da ação fiscal, logo, antes de o Estado ter ajuizado ação de execução da dívida previdenciária

Sendo a ação fiscal, a ação judicial propriamente dita, quando já existe a judicialização da conduta. Ocorre que há uma divergência de interpretação entre a doutrina penalista e a tributarista quanto ao momento exato da ação fiscal. Sendo que para a primeira a ação fiscal ocorre no momento do ajuizamento da execução fiscal, em contraponto com o entendimento tributarista, já que para esta o início da ação fiscal significa o momento inaugural da atuação administrativa de fiscalização tributária.

Para fins da caracterização do crime, para que não seja gerado uma interpretação in malam partem será oportuno a interpretação da visão penalista.

O doutrinador Guilherme de Souza Nucci apresenta o seguinte quadro:

a) se o Estado não ajuizou ação fiscal, tampouco ação penal: pago o débito integral, julga-se extinta a punibilidade do agente (§ 2.º do art. 168-A);

b) se o Estado já ajuizou ação fiscal, mas não a ação penal: cabe perdão judicial ou a aplicação do privilégio (§ 3.º, I);

c) se o Estado não ajuizou ação fiscal, mas sim ação penal: não cabe a extinção da punibilidade, pois seria o maior dos contrassensos exterminar a pretensão punitiva do Estado quando ele agiu a tempo, na esfera penal, sem ter havido boa vontade do devedor para saldar o devido à previdência, além do que o § 3.º, I, veda a aplicação do perdão e do privilégio – favores legais menores em comparação à extinção da punibilidade – quando a ação penal já foi iniciada.

Existe entendimento do STF que admite a extinção da punibilidade quando houver pagamento integral do débito, mesmo após o julgamento desde que seja antes do transito em julgado da condenação.  AP 516 ED/DF, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, Plenário, j. 05.12.2013, noticiado no Informativo 731

Perdão judicial e aplicação isolada da pena de multa: § 3.º

Criou-se, com o § 3.º do art. 168-A do CP, uma hipótese alternativa de perdão judicial (“deixar de aplicar a pena”) ou de privilégio (aplicação somente da multa). Mas há requisitos gerais e específicos. Os gerais, válidos para qualquer hipótese, são: a) primariedade; b) bons antecedentes.

I – tenha promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da contribuição social previdenciária, inclusive acessórios; ou II – o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais”.

“A faculdade prevista no § 3.º deste artigo não se aplica aos casos de parcelamento de contribuições cujo valor, inclusive dos acessórios, seja superior àquele estabelecido, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais”.

Esgotamento da via administrativa:

 

Se houver o deferimento, na órbita administrativa, do parcelamento do débito, autorizando-se o devedor a efetuar o pagamento, não há razão para deixar de excluir a sua punibilidade no campo penal. Afinal, o Estado aceitou receber o que lhe era devido e empreendeu um acordo com a parte devedora. Não haveria sentido algum em se aplicar qualquer punição.

a) Enquanto houver processo administrativo a existência, o valor ou a exigibilidade de contribuição social, atípica penalmente é a conduta.

b) É elemento normativo do tipo a existência da contribuição devida a ser repassada.

STJ:  HC 128.672/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 05/05/09.

Atinente ao referido parcelamento, no qual poderá a causar reflexo para propiciar um possível perdão judicial ou a redução de multas e juros, vale a pena destacar de que com a Emenda Constitucional 103/2019, a chamada Reforma da Previdência, passou a ser vedado a moratória e o parcelamento em prazo superior a sessenta meses.

Tendo como escopo o de por fim aos inúmeros parcelamentos especiais a longo prazo, que poderiam chegar até 240 (duzentos e quarenta) meses. Na prática tais prazos tão elastecidos beneficiavam a prática da sonegação fiscal.

Princípio da insignificância

O STF entende que os crimes tributários são compatíveis com tal principio se o recolhimento não ultrapassar R$ 20.000,00.

Vide Art. 20 da L 10.522/02 alterado pela lei 13.874/19 e regulamentado pelo artigo 2º da Portaria 75/2012 da PGFN.

Porém, o STF também já entendeu que não aplica HC 100.938/SC e 102.550/PR.

Sonegação previdenciária

O tipo penal do art. 337-A foi acrescido ao Código Penal pela Lei 9.983/2000, cujo objeto era conceder mais intensa tutela penal à seguridade social.

Suprimir (eliminar ou fazer desaparecer) ou reduzir (diminuir) são as condutas típicas, tendo por objeto a contribuição social previdenciária e seus acessórios. A supressão e a redução devem ser conjugadas com as condutas previstas nos incisos.

Contribuição previdenciária é espécie de tributo no qual através das contribuições sociais custeiam a seguridade social. Portanto a contribuição é um tributo e é obrigatório, sendo que a única exceção quanto a obrigatoriedade é a contribuição do contribuinte facultativo.

Na jurisprudência: STJ: “Segundo entendimento adotado por esta Corte Superior de Justiça, os crimes de sonegação de contribuição previdenciária e apropriação indébita previdenciária, por se tratar de delitos de caráter material, somente se configuram após a constituição definitiva, no âmbito administrativo, reconhecendo a regularidade do respectivo crédito (Precedentes)” (RHC 28798/PR, 5.ª T., rel. Campos Marques, 23.10.2012, v.u.).

O sujeito ativo é o titular de firma individual, os sócios, os gerentes, diretores ou administradores que efetivamente tenham participado da administração da empresa. Logicamente, os que possuírem efetiva participação na sonegação. O sujeito passivo é o INSS, autarquia federal encarregada da seguridade social.

Cabe ressaltar que o crime trata de um composto da supressão ou redução da contribuição social previdenciária associada à omissão (não menção) de segurados – empregado, empresário, trabalhador avulso ou autônomo ou equiparado que preste serviço – da folha de pagamento.

Folha de pagamento: “é o montante total da remuneração que o empregador irá pagar aos trabalhadores colocados a seu serviço. (…) Incidirá, assim, a contribuição sobre todos os valores pagos pelas empresas aos que exercem atividade remunerada a qualquer título e com ela estão relacionados, inclusive o pro labore dos sócios e dos diretores que não sejam empregados”.

Deve-se analisar o não lançamento (“lançar, contabilmente, é fazer o registro escritural dos pagamentos de interesse da Previdência Social: quantias descontadas dos segurados e devidas pelo propiciador de serviços”) com a supressão ou redução da contribuição social previdenciária. Assim, o agente que não fizer constar nos títulos de contabilidade da empresa as quantias que descontou dos segurados ou devidas pelo empregador ou tomador de serviços está sonegando.

De acordo com previsão do § 3.º, prescindinde a primariedade e os bons antecedentes, caso seja o empregador pessoa física e possuidor de folha de pagamento que não supere determinado valor, é possível, tendo havido sonegação de contribuição previdenciária, a redução da pena de um terço até a metade ou pode simplesmente ser aplicada a multa.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte especial (arts. 121 ao 361). Salvador, JusPODIVM, 2014.

MASSON, Cleber. Direito Penal – Parte Especial – Vol. 2 (Arts. 121 a 212), 9th Edition. Método, 02/2019.

MASSON, Cleber. Direito Penal – Parte Especial – Vol. 3 (Arts. 213 a 359H), 9th Edition. Método, 02/2019.

MASSON, Cleber. Código Penal Comentado–8th Edition. Rio de Janeiro/ Forense, São Paulo/Método,2020.

NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Penal : parte especial – arts. 121 a 212 do Código Penal. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

DIZER O DIREITO: https://www.dizerodireito.com.br/

https://receita.economia.gov.br/acesso-rapido/tributos/contribuicoes-previdenciarias-pj, acessado em 09 de agosto de 2020.

https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-previdenciario/seguridade-social-na-constituicao-de-1988/, acessado em 09 de agosto de 2020.

AMADO, Frederico. Curso de Direito e Processo Previdenciário. Editora Jus Podium, Salvador, 2020.

KERTZMAN, Ivan. Entendendo a Reforma da Previdência. Editora Jus Podium, Salvador, 2020.


Escrito por Felipe Vittig Ghiraldelli


Sobre o Autor: Delegado de Polícia do Estado da Bahia. Professor de Direito Penal e Processual Penal. Ex- docente da Unifeg, Facemp, FAN e atualmente leciona em cursos de graduação em Direito UniFTC, e Pitágoras, este como Coordenador Acadêmico do Curso de Direito. Professor de cursos preparatórios para carreiras policiais e jurídicas. Coach para concursos policiais, membro do Canal Carreiras Policiais. Pós graduado Direito Penal e Processual Penal com ênfase em penal econômico. Instagram: @professorghiraldelli


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